sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Santa Mariana, PR

Como eu previ no post do dia 10, o projeto "Santa Rosa de Calamuchita" deu uma desacelerada enquanto eu estava na Rússia, mas eu não pretendia mesmo me preocupar com o peso durante a viagem, por isso não fiquei aborrecida.

Mas já estou de volta no Rio de Janeiro e já retornei ao ritmo normal, e hoje, finalmente, terminei de atravessar o estado de São Paulo e cheguei ao Paraná: acabo de sair da cidade de Santa Mariana e peguei a BR–369 rumo à fronteira com o Paraguai.

É uma pena que esses marcos de 100 Km estejam quase sempre localizados na estrada, por isso as fotos acabam ficando muito parecidas. Cheguei a pensar em substituir as fotos das rodovias por fotos das cidades mais próximas, mas depois decidi que isso seria uma trapaça nas regras deste jogo maluco que eu inventei pra me distrair durante a dieta, por isso ficam as fotos da estrada mesmo, torcendo para o próximo marco ser dentro de uma cidade.

Saindo de Santa Mariana e pegando a BR–369

segunda-feira, 13 de outubro de 2014

Regras, Exceções e Preconceitos

Esta história aconteceu há muito tempo atrás, no tempo em que eu ainda era programadora. Logo no início do projeto, houve uma reunião de levantamento de requisitos à qual comparecemos eu, a gerente do projeto e duas representantes da área usuária. Eu e a gerente do projeto, como trabalhávamos no mesmo andar, fomos juntas até a sala de reunião e lá nos encontramos com uma das representantes da área usuária, que nos disse que a outra estava um pouco atrasada mas já estava chegando. E assim, ficamos as três esperando e, claro, puxando assunto, já que isso foi antes da época em que todo mundo tinha Internet no celular para ter um pretexto para não falar com os outros.

"Esse barulho? Ah, é: tem umas outras pessoas aqui. É, elas estão comigo... eu acho."
(Image courtesy of Ambro at FreeDigitalPhotos.net)

Conversa vai, conversa vem, a representante da área usuária contou que tinha se mudado para o Rio recentemente, pois era de Natal e sempre tinha morado lá. Coincidentemente, tanto eu quanto a gerente do projeto tínhamos estado recentemente em Natal em nossas respectivas férias. Eu disse que tinha adorado a cidade, achado o povo muito acolhedor e simpático (achei mesmo) e a gerente do projeto concordou, dizendo que a cidade era linda, "cheia de gente bonita, nem parece...". E aí ela empacou. Claro. Como dizer, na cara de uma nordestina, que o povo da cidade dela é tão bonito que nem parece nordestino? Porque ficou óbvio, para todas as pessoas na sala, que era exatamente aquilo que ela ia dizer antes de se tocar e engasgar no meio da frase, com aquele ar de pânico de um paraquedista que acabou de perceber que, na pressa de sair de casa, pegou a mochila errada.

"É... Pessoal? Nenhum de vocês por acaso trouxe um para-quedas a mais que possa me emprestar, trouxe?"
(By SKYDIVER1973 (Own work) [Public domain], via Wikimedia Commons)

Se eu tivesse pensado em alguma forma de ajudar, juro que tinha ajudado. Mesmo sendo bem-feito ela estar naquele aperto pra aprender a não falar bobagem, ainda assim eu teria ajudado. Mas, convenhamos, como é que se conserta uma situação dessas? E mais: como é que se conserta uma situação dessas mantendo, ao mesmo tempo, uma distância segura, sem correr o risco de ficar também associada àquela gafe fenomenal? É como ver alguém levando um choque: você quer ajudar, mas não quer encostar na pessoa pra não levar choque também.

"Nem vem! Da próxima vez, pensa antes de abrir a boca."

Enfim, o fato é que eu não consegui pensar em uma forma de salvar a situação, ela muito menos, e assim a frase ficou no ar, inacabada mesmo e causando aquele climão bonito na sala. E eu fiquei (e ainda fico) pensando nessas ideias de jerico que as pessoas têm e às quais são tão apegadas que, mesmo quando confrontadas com evidência em contrário, a sua reação não é dizer "Quem diria! Eu estava enganado a respeito dos membros desse grupo: nem todos têm essa característica!", e sim "Puxa, essa pessoa faz parte desse grupo, mas nem parece! Parece até que faz parte daquele outro grupo."

"Mas... você come hambúrguer! Tem certeza que você é japonesa?"
Ryanking999 | Dreamstime.com - Woman Loves Hamburger Photo)

A famigerada expressão "preto de alma branca" é um bom exemplo desse tipo de pensamento tosco. Outra muito usada por gente bem intencionada mas que não para pra pensar no que está dizendo é "ela é mais macho que muito homem", para se referir a uma mulher que é prática, determinada, não tem frescura. Pois essas, aparentemente, são características inerentemente masculinas, consequência da presença de um cromossomo Y e não de uma boa criação, auto-estima e caráter.

Dá pra entender alguém ter um conceito equivocado a respeito dos membros de um determinado sexo, religião, grupo étnico, nacionalidade, profissão etc se, durante toda sua vida, essa pessoa só conheceu membros desse grupo que se enquadravam nesse padrão. Quer dizer, dá pra entender mais ou menos, porque quem entende um mínimo de estatística (ou de bom senso) sabe que os doze advogados que você conheceu ao longo da sua vida não podem ser considerados uma amostra representativa dos mais de 120.000 advogados no estado do Rio de Janeiro, que dirá da classe como um todo. Sério, povo, para e faz as contas: se você conhece 12 advogados desonestos no estado do Rio, você não conhece nem 0,01% da categoria. Imagine comprar um pacote com 200 caixas de fósforo, o primeiro fósforo não acender e você jogar todas as 200 caixas fora. Pois é. É a mesma proporção.

"Infelizmente, este ano vamos ter que jogar fora toda a produção." "Por que?" "Aquele saco ali do fundo, tá vendo? Está estragado."
(Image courtesy of Sailom at FreeDigitalPhotos.net)

Não faz lá muito sentido, né? Mas ainda consegue fazer mais sentido do que considerar qualquer pessoa que não se encaixe no seu (pre)conceito não como uma exceção que prova que a regra não é assim tão universal e sim como um produto fora da especificação, um ser híbrido que pertence a um determinado grupo mas tem características de outro. E não enxergar (ou não querer enxergar, porque mudar de opinião dá um trabaaaalho!...) o quão ofensivo é você dizer a uma pessoa que as qualidades que ela tem, as tem apesar de ser nordestino / negro / mulher / <insira aqui o seu preconceito>. Isso, sim, é coisa não de homem, mulher, preto, branco, médico, argentino, paulista ou evangélico, e sim de gente meio ameba.

sexta-feira, 10 de outubro de 2014

Canitar, SP

Por um erro de cálculo, eu achei que a minha próxima parada no trajeto rumo a Santa Rosa de Calamuchita fosse ser em Ourinhos, mas, na verdade, a marca dos 8 Kg eliminados me deixou um pouco atrás, ainda na Rodovia Raposo Tavares, passando pela entrada para a cidade de Canitar.

Rodovia Raposo Tavares (entrada para Canitar)

Canitar é uma cidadezinha minúscula no interior de São Paulo, com — acreditem! — menos que 5.000 habitantes, de acordo com o IBGE. Ela fica perto da fronteira com o Paraná e é a minha última parada no estado de São Paulo: quando eu chegar a 900 Km de distância do Rio de Janeiro, já estarei no Paraná. Depois disso, Paraguai!

Não sei como será o ritmo da próxima semana, já que na segunda-feira embarco para São Petersburgo (ao contrário da minha viagem para Santa Rosa de Calamuchita, esta não é uma metáfora: realmente vou passar alguns dias na Rússia). Por um lado, isso quer dizer que não vou correr por uns tempos e que não vai ter dieta nesse período, também. Por outro, prevejo muita bateção de perna pelas ruas de Moscou e São Petersburgo, já que, convenhamos, viajar pra conhecer hotel é dose, né?

Já habilitei o meu celular para uso no exterior e adquiri um pacote de dados internacional, mas a intenção principal é mesmo manter a família atualizada e ciente que ainda estou viva. Se eu tiver tempo e disposição, atualizo o blog enquanto estiver lá: se não tiver, fica pra quando eu voltar.

Pelo Direito de Usar Luto

Atualmente não se usa mais luto. Ninguém se veste de preto (ou de branco: ouvi dizer que em certas culturas a cor do luto é o branco) quando morre uma pessoa querida. Sofre-se, é verdade, do mesmo jeito: a cor da roupa não faz ninguém sofrer nem mais, nem menos. Mas não se usa luto, não se veste nenhuma roupa ou cor específica para demonstrar exteriormente a dor interior.

E, embora a dor da perda seja, sem dúvida, algo interno e que independe de manifestações externas, me peguei recentemente pensando que não seria uma ideia assim tão ruim vestir luto e, assim, indicar ao resto do mundo que algo valioso foi perdido. Deveria-se poder usar luto não só pela morte de uma pessoa querida, mas por qualquer perda. Pelo fim do casamento, pela promoção que não saiu, pela amizade que não era tão sólida quanto parecia, pelo projeto que fracassou, pela pessoa que não quis ou não pôde retribuir o afeto, por tudo o que foi perdido e por tudo o que parecia que poderia ser conquistado mas acabou se revelando inacessível.

Sem necessidade de maiores explicações, o traje de luto já é informação suficiente para evitar comentários bem-intencionados mas nem sempre bem-vindos do tipo "Nossa, você está tão quieto(a) hoje!", "Por que você está tão sério(a)?", "Está chateado(a) com alguma coisa?". O traje de luto funcionaria como um letreiro luminoso sobre a cabeça do enlutado: "Não, esta pessoa não está com raiva de você. Ela não está achando a comida ruim, não ficou ofendida com o tom do e-mail nem achou a piada sem graça. Ela apenas está de luto. Deixa ela em paz. Ou então oferece chocolate."

Uma pessoa chateada pode ser animada com uma piada, uma happy hour, uma boa notícia. Uma pessoa de luto já tem problemas suficientes sem precisar fingir que está se divertindo para que as pessoas bem-intencionadas parem de perguntar se está tudo bem. Imagina estar com uma perna quebrada e ficarem perguntando todo dia: "E agora? Você já sarou? Se eu fizer uma massagem, ajuda?". As pessoas não fazem isso, e sabe por quê? Porque você está usando uma bota imobilizadora enorme que deixa bem claro que não, você não vai jogar futebol hoje e não se trata de corpo mole.

O luto não é uma forma de negociação, para as pessoas se sentirem mal por você e te darem o que você quer: vestir luto é uma forma de admitir a derrota, de reconhecer que é "game over" e que o que foi perdido não vai voltar. O luto é final.

Ao mesmo tempo, o luto é passageiro. Ele pode durar dias, semanas ou meses, mas um dia ele passa. E, nesse dia, basta despir o véu, tirar do armário aquela blusa vermelha e sair para a rua, novamente sem precisar explicar nada para ninguém. Sem alarde e sem grandes manifestações.

Eu acho que a gente devia vestir luto sempre que fosse necessário. Sem explicações, porque cada um sabe de si e sabe onde dói. Não importa se um é demitido e segue em frente sem se abalar e o outro quebra um copo e senta no chão e chora. O luto é democrático: todo mundo já sabe, só de olhar para você, que não importa o que aconteceu, importa é que te deixou sem chão. Talvez você conte para as pessoas mais próximas o que aconteceu. Talvez, mais cedo ou mais tarde, todo mundo acabe sabendo de qualquer jeito. Ou talvez você guarde tudo a sete chaves e nunca, jamais conte pra ninguém. De uma forma ou de outra, todo mundo deveria poder passar pelo seu período de luto sempre que necessário, sem precisar compartilhar mais do que quisesse, mas também sem ficar com o maxilar doendo de tanto sorrir sem vontade.

Pronto, falei.

Image courtesy of Stop2pray @ FreeImages

quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Estrada Vicinal Iaras – Cerqueira César

Há alguns posts atrás, eu disse que tinha 226 Km de Rodovia Presidente Castelo Branco para percorrer na minha jornada até Santa Rosa de Calamuchita. Assim, para variar um pouco e não postar tantas fotos da beira da estrada, pulei o marco dos seis quilos e estou celebrando hoje o sétimo quilo eliminado. Mantendo a comparação com a rota Rio de Janeiro – Santa Rosa de Calamuchita, acabei de cruzar a rodovia para entrar à esquerda na Estrada Vicinal Iaras – Cerqueira César.

Essa coisa impressionante aí é a Estrada Vicinal Iaras – Cerqueira César

Com todo o respeito pelos habitantes de Vicinal Iaras e de Cerqueira César, a estrada é tão no meio do nada que nem o Google Street View  tem foto dela. A última foto disponível é essa aí de cima, logo depois de cruzar a Rodovia Presidente Castelo Branco e embicar em direção à Estrada Vicinal Iaras – Cerqueira César. E é bem aí que eu estou nesse momento. Enquanto paisagem, não é exatamente uma visão impressionante, mas representa 23% da meta atingida, o que, convenhamos, não é nada mal.

Essa sou eu, na seta vermelha.