sexta-feira, 26 de setembro de 2014

Fazenda de Expectativas

Anda na moda postar no Facebook que não se deve criar expectativa. Que é melhor se surpreender do que se decepcionar. Que, se for pra criar, que se criem galinhas, porcos, gatos, cachorros, demônios da Tasmânia ou pôneis malditos, mas nunca expectativas. Que, se você se decepciona, a culpa é sua: quem mandou criar expectativa?

"Nada disso teria acontecido se você não tivesse criado a expectativa de que o celular teria sinal."
(Image courtesy of stockimages at FreeDigitalPhotos.net)

Ao que eu digo: crie expectativas, sim. Crie galinhas, crie porcos, crie patos se der na telha, mas não abra mão jamais do seu direito de criar expectativas. Crie uma fazenda inteira de expectativas, se quiser, porque as expectativas são aquilo que nos impulsiona para frente.

É verdade que as expectativas nem sempre se concretizam. Às vezes a gente exagera no otimismo, interpreta errado os sinais, mete os pés pelas mãos e coloca tudo a perder. Bem vindo à vida adulta. A gente erra, aprende e segue em frente. E é verdade que, se não tivéssemos criado expectativas, a decepção teria sido menor. Mas, e quando dá certo? Porque às vezes dá certo, por incrível que pareça e por mais que na hora da derrota pareça que nunca mais vai dar certo. Às vezes dá certo, e o sucesso é mais saboreado quando vem depois de muita expectativa.

É melhor se surpreender do que se decepcionar? Claro que é, mas essa é uma frase idiota: é como dizer que é melhor pagar caro por um produto bom do que pagar caro por um produto ruim, como se não houvesse outras opções além dessas duas. Pagar R$ 30,00 por um chocolate da Copenhagen realmente é melhor do que pagar R$ 30,00 por um pacote de biscoito de maisena, mas bom mesmo é pagar R$ 3,00 por um chocolate da Copenhagen.

Ou R$ 30,00 por dez chocolates da Copenhagen.
(Image courtesy of Nkzs at FreeImages)

Da mesma forma, se surpreender é melhor do que se decepcionar, mas, melhor ainda do que se surpreender é botar a maior fé que alguma coisa vai acontecer, e torcer, e lutar por isso, e fazer tudo o que está ao seu alcance e, no fim... não é que acontece mesmo? Do jeito que você queria e esperava?

Se decepcionar é uma droga, mas não dá pra adivinhar quando a gente vai se decepcionar e quando vai conseguir aquilo que deseja: se fosse assim, a gente alinharia as expectativas com antecedência. Mas a vida não é assim. A gente avalia a situação, pesa os prós e os contras e, se achar que dá pé (ou se não tiver muita certeza de que dá mas quiser muitão que dê), cria a expectativa e corre atrás. Porque, se não criar expectativas, vai fazer o quê? Ficar sentado no sofá da sala assistindo reprise de Lost pra ver se, da segunda vez, a história faz mais sentido? É porque criamos expectativas que corremos atrás, que tentamos consertar o que está quebrado e recuperar o que foi perdido. Porque achamos que dá pé. Que pode rolar. Que, desta vez, vai. E, se não tentarmos, aí é que não vai acontecer mesmo.

Se nem você botar fé nessa relação, nesse emprego, nessa viagem, nesse contrato, como esperar que outra pessoa bote? Se você acha que a possibilidade da vitória não vale o risco de uma decepção, então não vale a pena, ponto. Joga logo a toalha e vai tentar a sorte em outro lugar, com outra pessoa, de outro jeito. Vai para algum lugar onde haja expectativas.

Eu crio, sim, expectativas. Crio muitas, crio uma fazenda cheia delas, correndo livres pelos prados e é uma coisa linda de se ver. E, se algumas delas às vezes morrem (são criaturinhas frágeis, as expectativas), eu choro e visto luto por elas, mas o tempo passa e quando mesmo se espera (quando menos eu mesma espero) já estou criando outras.

"Quando não houver desejo, quando não restar nem mesmo dor, ainda haverá desejo dentro do seu coração, aonde Deus colocou." (Enquanto Houver Sol - Titãs)
("Mustang Utah 2005 2" by Jaime Jackson. Licensed under CC BY-SA 3.0, via Wikimedia Commons)

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