domingo, 15 de janeiro de 2017

Eu Sou a Favor da Limitação da Banda Larga

O debate sobre o fim da Internet ilimitada começou no ano passado, depois pareceu que tinha sido encerrado, mas ressurgiu novamente há alguns dias após uma declaração do ministro da Ciência, Tecnologia, Inovação e Comunicações de que o modelo de franquia de dados pode vir a ser implementado este ano, sim. A Anatel disse que não, o Anonymous ameaçou começar uma guerra e, claro, um novo hashtag foi criado. #NaoAOLimiteDeInternet

Ou, no meu caso, #LimitaTudoSim. Sim, eu sou a favor dos planos de Internet fixa com limite de tráfego de dados: o título deste artigo não foi só pra chocar e atrair leitores para o blog. E por que eu sou a favor? Que bom que você perguntou (ou, pelo menos, que bom que ainda não parou de ler o artigo).

Imagine que você vai comer fora e tem que escolher um restaurante. Você pode escolher uma churrascaria rodízio, um restaurante de comida a quilo ou um restaurante a la carte. Se você for na churrascaria rodízio, sabe que pode comer o quanto quiser, de qualquer tipo de carne ou acompanhamento disponível. O preço é o mesmo, não importa quanto ou o que você coma. Se você for na comida a quilo, o preço varia dependendo da quantidade (mas não do tipo) de comida. Comeu mais, pagou mais; comeu menos, pagou menos. Finalmente, no restaurante a la carte você paga pelo prato inteiro, independente de ter só beliscado ou de ter raspado o prato e ainda passado um pãozinho no fundo pra pegar o restinho de molho, mas os preços variam de acordo com o tipo de prato: normalmente, massa é mais barato do que filé que é mais barato do que bacalhau.

O que nós temos hoje na Internet do Brasil é uma mistura de churrascaria rodízio com restaurante a la carte: o preço varia de acordo com o prato (velocidade), mas é o mesmo independente da quantidade consumida. E, assim, como na churrascaria rodízio, é claro que está todo mundo pagando pelo maior consumo, porque o dono do restaurante não está aqui pra levar prejuízo. Minha tia que só usa a Internet para enviar e-mail paga o mesmo que uma família que assiste de três a quatro filmes por dia, que é o mesmo que paga quem baixa todos os filmes que estão em cartaz enquanto joga online, que é o mesmo que paga quem trabalha de dia e estuda à noite e só usa a Internet nos fins de semana, que é o mesmo que paga o YouTuber que sobe conteúdo novo dia sim, dia não, que é o mesmo que paga quem trabalha em casa e estuda online, que é o mesmo que paga quem passa a madrugada no RedTube (só por causa das entrevistas, claro).

Eu sei que permitir que as operadoras ofereçam planos de Internet com franquia de uso de dados não vai baixar os preços da noite para o dia: mais provavelmente vai continuar todo mundo pagando o mesmo valor que paga hoje, só que agora com limite de uso de dados. E, não, isso não é legal. A questão é que do jeito que está hoje também não é legal: é injusto pra muita gente que precisa de Internet, mas não de tanta Internet assim, e está rachando a conta com o povo que precisa de tanta Internet assim.

"Precisa", no caso, é maneira de falar.
© Yadvigagr | https://www.dreamstime.com/ - Computer Tablet With Internet Icons Photo

Ou seja, o sistema já está errado hoje, e não é certo eu querer que ele continue errado só porque o sistema atual dá menos errado pra mim do que o novo que estão propondo (aqui em casa é um desses casos em que se assiste até mais do que três a quatro filmes por dia). Faz muito mais sentido que quem consome mais pague mais do que quem consome menos, e o primeiro passo para isso é permitir que as operadoras tenham planos com franquias diferentes para oferecer a usuários diferentes. Se os preços vão ser justos ou não, aí já é outra negociação, mas pelo menos vai passar a ser possível fazer essa negociação. Vai ter empresa oferecendo um plano mais barato com uma franquia diminuta tentando atrair a pessoa que hoje não tem Internet em casa. Vai ter empresa oferecendo um plano com mesmo preço do concorrente, mas com franquia maior pra tentar roubar os clientes do outro. É a tal da oferta x demanda. Vai ter até empresa oferecendo plano com Internet ilimitada, garanto. Vai ser mais caro do que é hoje? Com certeza. Sabe por quê? Porque cada um vai estar pagando só pela sua Internet, sem dividir a conta com outra pessoa que quase não usa a Internet.

Ao invés de brigar pra continuar todo mundo pagando muito por mais do que precisa, a gente devia estar brigando para cada um pagar o preço justo só pelo que precisa, e essa briga só pode ser feita se a Anatel se preocupar menos em engessar o sistema e mais em ajudar o consumidor a fiscalizar se está efetivamente recebendo a largura de banda que contratou e a denunciar cobranças abusivas e outras formas de não cumprimento de contrato. E deixar o sistema o mais flexível possível para que mais empresas queiram entrar nele oferecendo seus serviços. Deixa o povo abrir churrascaria rodízio, comida a quilo, restaurante a la carte, lanchonete, drive through, loja de comida congelada. A nós, consumidores, cabe pesquisar preços, negociar, ameaçar mudar de operadora, mudar mesmo de operadora, cobrar, denunciar, brigar pelos nossos direitos. Não é fácil, mas é parte do jogo.

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